sábado, 22 de setembro de 2012

Crise, submarinos e PGR


O golpe do líder do CDS-PP, o anúncio atabalhoado da TSU e a grande manifestação do passado dia 15 resultaram num despertar extraordinário da consciência cívica dos portugueses.

A sociedade portuguesa, qual panela de pressão à beira de rebentar, não aguentou e foi para a rua, civilizadamente, manifestar o protesto por anos e anos de atropelos e desrespeito pelas mais elementares regras do jogo democrático.

Infelizmente muitos confundiram o silêncio e a resignação dos portugueses com sinais de passividade. Outros até querem, à viva força, reduzir os protestos a uma mera reacção ao anúncio da subida da TSU. Mas não é por acaso, certamente, que a contestação se demarcou de todos os partidos políticos, beneficiando da ampliação cirúrgica dos órgãos de comunicação social desesperados por mais vendas e audiências.

Com mais ou menos conclave de líderes da maioria, reunião partidária de barões partidários, debate parlamentar ou maratona do Conselho de Estado, a verdade é que a situação já escapou ao controlo das instituições.

Acabou o tempo dos discursos habilidosos de um lado e do outro, pois os protestos estão a visar muito mais do que a austeridade brutal.

Se o poder político quiser sobreviver tem de evitar encenações institucionais ridículas e rituais de autoridade patéticos.

A descredibilização da presidência, a demagogia da oposição parlamentar e os sucessivos erros de Passos Coelho, a propósito das nomeações de boys, da privatização da EDP, da polémica das secretas e da manutenção de Miguel Relvas em funções, entre muitos outros, criaram um rastilho suficiente para fazer deflagrar a bomba da indignação.

Os portugueses estão a dar sinais visíveis e audíveis de que não estão dispostos a fazer mais sacrifícios enquanto permanecerem as suspeitas de corrupção, de nepotismo, de mentiras descaradas e de negociatas de Estado, enfim, de distanciamento do poder em relação aos cidadãos. As avaliações positivas da troika já não são suficientes.

Pela primeira vez, o habitual paleio daqueles que usam e abusam da dicotomia da esquerda e da direita foi por água baixo. Afinal, não é só Passos Coelho que está à beira de se afogar. É o todo o espectro político que passou a navegar em alto mar à beira do desastre.

Chegados aqui, resta perguntar: qual vai ser o epílogo deste despertar dos portugueses?

Neste momento, ninguém sabe.

Todavia uma coisa é certa: acabou o tempo em que os portugueses se limitavam a votar ordeiramente quando eram chamados às urnas.

Chegou a hora da governação com sentido de proximidade.

As últimas manifestações têm de ser olhadas com a atenção. É fundamental provar aos portugueses que os problemas que estão há décadas a montante das questões económicas e financeiras, como a Justiça, serão abordados com seriedade.

Não é de admirar que os portugueses concentrem as atenções, por exemplo, na triste novela dos submarinos e do desaparecimento dos contratos, entre outros escândalos judiciais que são atirados para debaixo do tapete com um descaramento inaudito.

Por isso também acabou o tempo do benefício da dúvida concedido a Paula Teixeira da Cruz, ministra da Justiça.

A escolha do próximo procurador-geral da República pode ser o último balão de oxigénio desta democracia formal, que já perdeu há muito tempo o respeito por si própria.

A escolha de um nome que resulte apenas de mais um mero entendimento partidário, institucional e sindical pode ser o passo irreversível em direcção ao abismo.

A hora da mudança também chegou, finalmente, a Belém e a São Bento.

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